quinta-feira, 5 de julho de 2007

Contos da Metrópole: Parte I - A Cidade dos porcos

“Uma nuvem negra sobrepõe cidade profana

Onde se criam monstros como se criam galinhas

Ali impera o cataclismo e a sepultura de Lúcifer

Onde os ratos são homens, e os homens são os ratos.

Uma névoa podre paira sobre a cidade

Onde tudo é mentira e nada é verdade

E essa cidade fica negra mais negra do que a noite

Uma cidade agitada

Carregada pelo mal

Pelo mal.”

Cidade dos Porcos – Vulcano (do álbum On Pushne Namah) – 1983

Sempre pegava o mesmo ônibus todo o maldito dia.

O trânsito de São Paulo já não era mais novidade para quem convivia dia-a-dia com o calor infernal do verão e da fumaça asfixiante dos veículos que lotavam a Avenida 23 de Maio às 18 horas da tarde em meio ao horário de rush. O clima poético da metrópole da garoa se perdia por completo em seus novos tempos de tensão cotidiana. O trabalho, os comércios, a pressa dos pedestres e a buzina dos carros eram provas totais de um sossego utópico que jamais voltaria àquele lugar.

As idéias e o trabalho davam espaço ao cansaço de minha mente, martirizada pelas nove horas seguidas de trabalho numa prisão fria de escritório, respirando ar e pó por todo o tempo. As pálpebras pesavam e eu podia sentir a sujeira de fuligem e a respiração que queimava meus pulmões como se estivesse fumando sem estar. Ainda que tentasse um curto momento de descanso, o transporte lotado com pessoas mestiças de aparência estranha, com sotaques muitas vezes mais comuns em lugares distintos do nordeste do Brasil do que em São Paulo, falando alto, se empurrando nessa que parecia uma Babel horrenda, esmagando-se como sardinhas em lata incomodamente dentro de um veículo que andava a menos de dez quilômetros por hora.

O pior de todos os inimigos não era as estranhas pessoas, o aperto ou mesmo o cansaço, mas o Sol que castigava meu rosto como um forno de microondas em capacidade máxima, destruindo e ressecando a pele das bochechas como uma carne ressecada.

Um forte suspiro para reativar os ânimos e levemente espremi meu rosto com as mãos para espantar o sono e manter-me acordado naquela tarde. Meus olhos procuravam horizontes novos ou novas atenções para que esquecesse um pouco a dor física e me centrasse em algo quem sabe um pouco mais interessante.

Neste justo instante algo sinistro aconteceu; algo que se escondia sob os escombros e lixos da grande cidade, onde num passado remoto alguém premuniu o Armageddon, mas todos ignoraram a estranha mensagem que foi deixada.

Em um momento de tontura, provavelmente já causada pelo cansaço e pela hipoglicemia, eu vi entre os muros antigos que outrora eram bases de casas antigas de tijolos castigados pelo tempo, agora se revelavam pela força das chuvas de verão, mostrando em suas encostas removidas do barro agora, memórias de uma cidade que o tempo cobriu.

Naquilo que o dia foi a parede de uma casa, duas frases escritas apressadamente com tinta branca haviam surgido entre o musgo negro que as águas da última noite haviam lavado. Havia algo naquelas duas frases que me incomodaram, como se uma verdade tivesse sido omitida de todos, como se abaixo de todo um sistema colossal abrigasse algo de horror inominável.

Ali de relance, mal consegui ler aquelas duas frases, mesmo sabendo muito bem o que vi, ainda me atormentam em minha mente. Uma justamente embaixo da outra, sendo a última ainda parcialmente coberta pelo barro de décadas:

“Vocês em suas qualidades de DEMÔNIOS”

“Além de serem é a SICA”

A estranha frase que começava de modo negro perdia seu sentido na parte inferior. Seria um erro de ortografia? Perguntei a mim mesmo... Ou será que algo mais abaixo ainda precisava ser lido e revelado? Não sei! Entre as frases escondidas havia com a mesma tinta caveiras desenhadas em todas as árvores ao redor do campo, como um cemitério exótico, ou uma barreira de energia protegendo um terreno maldito esquecido pelas pessoas que passavam por ali.

A primeira frase parecia ser uma acusação à alguém ou algo por qualquer fato obscuro que tenha ocorrido, mas a segunda frase se tornara mais inquietante pelo fato de não fazer o menor sentindo! SICA? O que seria isso? Alguma gíria ou erro... ou poderia na mais abissal das hipóteses do autor daquilo não tenha tido tempo para concluir aquilo...

Ao mesmo momento a minha tontura aumentou. Como se uma visão dos céus caísse sobre meus olhos, trazendo a luz do Sol escaldante me ofuscando com o clarão, ao mesmo tempo em que parece que vi as imagens de caveiras desenhadas nas árvores rirem pra mim numa sintonia de loucura e dor, vindo me buscar e aprisionar minha alma para sempre naquela encosta amaldiçoada, para sempre poder observar os carros indo e vindo, com as mesmas pessoas apressadas voltando para casa com o mesmo sentimento que tinha antes de tudo isso.

Daí já não pude ver mais nada.

Acordei dois dias depois no hospital Beneficência Portuguesa, me recuperando de insolação e em estado de choque. Segundo os médicos eu tive uma alucinação ocasionada pelo estresse do trabalho e cansaço físico, coisa típica de uma grande capital. Na hora que desmaiei no ônibus fui rapidamente socorrido e levado para o hospital. Não me lembro de ter ouvido gritarias e nem de ninguém me levando. Quando contei minha história para as pessoas, estas disseram nunca terem prestado atenção na estranha inscrição nas paredes em ruínas ou mesmo terem visto. Alguns outros zombaram que eu estava ficando louco, pois não havia nada lá.

Sei o que vi e sei o que há lá. Escondido dos olhos mal treinados a mensagem ainda continua lá e pode ser vista por quem quer que seja. Mas mesmo assim nunca mais será vista... A correria e a pressa impedem as pessoas de presenciar com calma as coisas que ocorrem em suas voltas e mesmo que por longas décadas aquilo continua escrito, trazendo quem sabe uma mensagem profética que todos pudessem ouvir e sentir como aconteceu comigo, será sempre o que foi e o que será o resto das paredes cinzas dos grandes prédios abandonados... Apenas fantasmas perdidos da grande cidade...

E eu ainda ouço as caveiras pintadas nas árvores rirem de mim...

2 comentários:

mih viking disse...

Estive lendo esse Contos da Metropole:A Cidade dos Porcos,O que me chamou a atenção,pois este homem retrata algo que ele viu e vive em São Paulo e de uma escrita que ele viu na parede de uma casa...

“Vocês em suas qualidades de DEMÔNIOS”
“Além de serem é a SICA”


Algo que para ele o atormentou e ele quis descobrir
Para as pessoas que passavam e nunca viam por aquele lugar quando ele contou achavam que ele era louco
Mas os loucos sao aqueles que nao reparam nas coisas que podem fazer sentido ou mostrar um caminho.
Vao ao local que vcs verão essa escritura.
Bom é isso leiam pois é muito interessante.
Saiam do msn e orkut e leiam algo interessante como isto.

Anônimo disse...

è trOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!!!!!!

ate que enfim um blog que preste!!

\m/Ò.Ó\m/

Odinnnnnnnnn!!!!!